Café com Bioeconomia: Propriedade Intelectual na Gestão da Inovação
A edição de 30 de outubro de 2024 do Café com Bioeconomia reuniu Leonardo Cordeiro, sócio no Escritório Gruenbaum, Possinhas & Teixeira de Propriedade Intelectual; Kelly Janoski, coordenadora de Propriedade Intelectual da Raízen; e Miguel Carvalho, coordenador-geral de Propriedade Intelectual do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços. O encontro, mediado por Rosane Lopes (Instituto SENAI de Inovação em Biossintéticos e Fibras), ocorre a cada três semanas, promovendo discussões sobre temas centrais da bioeconomia.
A Proteção da Propriedade Intelectual e o Impulso à Bioeconomia no Brasil
No relatório State of the Global Bioeconomy, o Fórum Mundial de Bioeconomia estima que o setor tenha um valor de US$ 4 trilhões, evidenciando a valiosa oportunidade de ingressar nesse mercado. O Brasil tem sido pioneiro na área de biodiversidade desde a década de 1990, e em maio de 2024 foi assinado o “Tratado sobre Propriedade Intelectual, Recursos Genéticos e Conhecimentos Tradicionais Associados”, na Conferência Diplomática da Organização Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI), que visa garantir o respeito ao patrimônio genético e ao conhecimento dos povos indígenas e comunidades tradicionais, além de promover o acesso à biodiversidade.
Leonardo Cordeiro destacou que a Propriedade Intelectual (PI) é o "coração da inovação", essencial para garantir o avanço da bioeconomia no Brasil. Ele enfatizou a importância da autonomia das autarquias, como o INPI (Instituto Nacional da Propriedade Intelectual), para responder rapidamente às demandas nacionais e internacionais. Leonardo também alertou para a necessidade de disseminar o conhecimento sobre PI, visto que ele envolve interesses políticos, jurídicos, sociais, econômicos e administrativos.
Kelly Janoski, por sua vez, ressaltou que o Brasil possui grande biodiversidade, o que abre oportunidades para transformar a bioeconomia, aproveitando seus recursos de forma sustentável e inovadora. Para ela, a PI protege as inovações e assegura o desenvolvimento de novas tecnologias sustentáveis, como a utilização de biomassa e a busca por baixas emissões. Além disso, a PI pode fortalecer mercados, como o de biocombustíveis e biomateriais, e deve ser vista como uma ferramenta estratégica para empresas, não apenas como um custo, mas como um investimento com alto retorno.
Miguel Carvalho acrescentou que a PI é uma ponte entre investimento e conhecimento, fundamental para gerar inovações. Ele acredita que a PI deve ser usada de forma estratégica para comunicar a biodiversidade e integrar o público externo, algo crucial dado o baixo nível de disseminação e capacitação na área no Brasil. Ele também destacou a importância de regulamentar tratados internacionais para evitar a biopirataria e a apropriação indevida de recursos genéticos.
A PI na Transição Energética e Desenvolvimento de Tecnologias
Kelly reforçou que a PI pode impulsionar tecnologias emergentes, estimulando a competitividade no mercado com base em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I). A PI promove a integração entre a indústria, universidades e instituições de pesquisa, além de agregar valor à inovação ao transformar conhecimento em soluções práticas e aplicáveis.
Miguel apontou que a PI facilita a transferência de tecnologia e é um importante instrumento nas parcerias entre a indústria e os Institutos de Ciência e Tecnologia (ICTs), um avanço que o Brasil precisa continuar a expandir. Ele destacou que ações de matchmaking para tecnologias verdes, como a transição energética, bioeconomia e descarbonização, são essenciais para acelerar esses processos.
Leonardo também mencionou a retroalimentação das pesquisas como essencial para explorar melhor as tecnologias, usando como exemplo a redução de custos na produção de placas solares, impulsionada pelo desenvolvimento de PI por diferentes empresas.
O Programa “Patentes Verdes” do INPI
Miguel destacou o programa de Patentes Verdes do INPI, que acelera o processamento de pedidos relacionados a tecnologias verdes, conferindo um "selo" que agrega valor às invenções e facilita sua comercialização. No entanto, ele observou que um dos maiores desafios para as empresas é enquadrar corretamente suas tecnologias nos requisitos do INPI para aproveitar os benefícios do programa.
Leonardo destacou a evolução do programa, com trâmites mais rápidos e resultados mais eficazes, tornando as tecnologias mais atraentes para o mercado. Ele também comentou sobre a importância do quadro reivindicatório no pedido de patente, que deve ser equilibrado para evitar cópias por concorrentes, e mencionou o limite de 15 reivindicações para acelerar o exame pelo INPI.
Kelly, por sua vez, lembrou que, quando o programa foi lançado, era necessário demonstrar previamente o valor da patente para o depositante, dada a necessidade de investimentos. Ela acredita que a patente concedida tem maior potencial de marketing, o que facilita a transferência de tecnologia e atrai investidores. No entanto, ela alertou para a falta de conhecimento das empresas e do público sobre o programa, o que representa um grande desafio.
A Propriedade Intelectual no Processo de Neoindustrialização do Brasil
Miguel explicou que o programa Nova Indústria Brasil (NIB) usa a PI como instrumento chave para a neoindustrialização, especialmente nas missões voltadas à bioeconomia, descarbonização e transição energética. Ele enfatizou que as mentorias e parcerias entre a indústria e a academia são fundamentais para aumentar o uso sustentável da biodiversidade e acelerar as transições energéticas no Brasil.
Leonardo complementou, ressaltando que o Brasil precisa fortalecer as parcerias público-privadas e investir mais em tecnologias para melhorar sua posição no Índice Global de Inovação. Embora o país esteja bem posicionado na América Latina, ele acredita que poderia alcançar mais resultados com maior investimento em inovação e tecnologia.
Kelly também destacou o potencial dos bancos de patentes no Brasil, que podem contribuir para o desenvolvimento de novas tecnologias a partir da biodiversidade. Ela reforçou a necessidade de uma mudança na percepção do papel estratégico da PI, o que exigiria ações do governo federal para promover essa visão.
Disputas de Propriedade Intelectual em Biotecnologia
Kelly compartilhou exemplos notáveis de disputas de PI, como a tecnologia CRISPR, em que universidades disputaram a autoria do desenvolvimento, e as sementes da Monsanto, que geraram conflitos com produtores rurais. Ela também mencionou que a Raízen, com sua forte atuação na biotecnologia e produção de etanol de 2ª geração (E2G), busca inovação por meio de parcerias com startups e empresas focadas no agronegócio e processos biotecnológicos.
O Café com Bioeconomia é um evento online e interativo, no qual especialistas e público discutem temas relevantes para a bioeconomia. Para participar dos próximos encontros, basta inscrever-se em: https://portaldebioeconomia.com/